Tuesday, January 29, 2008

CRISE ou OPORTUNIDADE

A crise que brota da economia americana refletirá na maioria dos países porque a globalização os liga como vasos comunicantes. Porém, muitos “especialistas”, de modo simplista, dirão que a culpa da crise é da globalização. Não é verdade, ela é solução. Para compreender a crise é preciso nos reportar aos problemas monetários, pouco e mal estudados.

As perturbações econômicas, sociais e políticas no curso da primeira guerra mundial que se multiplicaram com o segundo conflito, obrigaram uma revisão das idéias sobre a moeda. O economista e filósofo Sturt Mill traduzia a opinião de sua época, referindo-se à moeda como um “véu” que obscurecia que escondia a realidade econômica, e que, convinha abstrair do raciocínio, simplificando-a assim sem a deformar.

Parece paradoxal, mas, as instituições que menos entendem a moeda são os bancos centrais, salvo raras exceções. Seus dirigentes, nos escritórios requintados, vivem fantasias que o dinheiro farto permite, porém, não enxergam o palco da vida real, como ele é. Por isso, desvirtuam a função da moeda.

A crise vem de longe! O dólar internacionalizado beneficia os Estados Unidos porque exportam papel moeda e recebem riqueza real. O desenvolvimento da comunicação e dos meios de transportes que movimentam montanhas de mercadorias exige mais hoje daquela economia, do que antes, e fragiliza o império. Esse fato criou para o país dificuldade permanente no administrar, porque o conhecimento e as informações alimentam exigências. A fantástica soma de dólares que circula, reduz a margem de manobra do BC americano, que pisa em ovos. O consumismo que brotou da exportação de moeda em troca da riqueza real alimenta o déficit público como moto-contínuo, e gera mais pressão.

O desequilíbrio leva à perspectiva de novo espetáculo de desvalorizações de todas as moedas e apavora, porque, mesmo aquelas cuja estabilidade havia acompanhado e protegido o desenvolvimento extraordinário das economias ocidentais, da revolução industrial a 1914, cuja observação repetida das inflações e de seus efeitos econômicos e sociais devastadores, puseram em evidência a importância da moeda. Alguns acusavam-na de ser a causa essencial desses desequilíbrios, outros a consideravam instrumento decisivo que permite eliminar e evitar a reincidência de tais inflações.

O grande mal da humanidade é não saber lidar com o dinheiro. Por isso, a má distribuição de renda que leva à violência, à falta de educação e cultura, tem relação direta com o gerenciamento superficial, incoerente, e às vezes irresponsável da moeda.

A crise pode virar oportunidade. Basta que o BC veja a moeda como instrumento e não, como finalidade. Assim, o Brasil pode sair ileso e capitalizado. O BC não pode cometer o mesmo erro: no 1º mandato de Lula o juro deveria ter sido reduzido por decreto. Havia clima para isso. Baixou a conta gotas, demorou tanto, que antes de reduzi-lo ao patamar compatível com a realidade da produção, os plantonistas já pensam em aumentá-lo. Perdemos tempo precioso de crescer como outras economias

É preciso compreender que entre os instrumentos criados pelo homem, a moeda é um dos mais preciosos para atuar sobre a atividade econômica. Sem ela, nenhum progresso material e humano teria sido ou seria possível. A moeda deve ser protegida. A ninguém interessa a sua desvalorização. As suas funções: medida de valor, reserva de valor, e intermediária das trocas devem ser assimiladas porque na crise há que se reportar a elas com sabedoria.

O dinheiro desmaterializado, sem valor intrínseco, sustentado no império da lei e na crença popular, agrega séculos de desenvolvimento. Nessa condição, está a sua grandeza de ferramenta poderosa, mas também, a sua vulnerabilidade.

O BC deve fazer diferença no trato do juro para o investimento e para o consumo. O endividamento do consumidor brasileiro deve ser aproveitado para fortalecer a produção. O crédito fácil consignado serviu pouco para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, e muito, para aumentar o lucro dos bancos, é contraditório.

É urgente que os poderes afinem o discurso e façam da crise oportunidade para fortalecer o mercado interno. É hora de reduzir o superávit primário, de fomentar o investimento novo, e o de atualização. Agora os preços dos bens de produção poderão cair. A ação rápida do governo fará diferença para sairmos melhores da crise. O clima interno é favorável. Entretanto, há que se exigir dos bancos, parceria social e não a exploração. Assim, a moeda cumprirá a sua função institucional: resgatar milhões de brasileiros da pobreza.

Eustáquio Costa